feminismo e backlash

Assim, não que a questão acadêmica seja importante, mas é importante lembrar o quanto o movimento feminista foi sequestrado pela academia. A questão é simples e começa por: quando os estudos de mulheres se transformaram em estudos de gênero? Quando surgiu “gênero” e o que sua substituição pelo termo “mulher” que dizer? Eu vejo assim: a cartada acadêmica é sempre Judith Butler e Beatriz Preciado. Ótimo. Mas quais são as bases epistemológicas dessas autoras? Freud, Lacan e Foucault.

Não que eu ache esses autores descartáveis. Jamais. Eu estudo psicologia e tenho um pé em psicanálise e outro na luta antimanicomial. Quem gosta dessas áreas sabe a importância desses autores, mas a questão aqui é: no que eles são importantes para um movimento de mulheres? Três homens, brancos, acadêmicos, elitizados, falocentrados. O que eles têm de verdade para contribuir com nossa questão?

Falo isso, porque, cansei de ler texto escrito por mulher de maneira bela e científica, mas que não tem essa valorização dentro dos espaços acadêmicos. Cansei de participar de reuniões feministas e tudo que eu ouvia era “privilégio cis”, e tive que aguentar quieta, mesmo sabendo o número de mulheres que discordavam disso, porque afinal, ainda não somos academicamente aceitas. Cansei de falar sobre Audre Lorde e Sheila Jeffreys, e ver a cara de espanto das pessoas, porque elas nunca ouviram falar dessas duas autoras. “Poxa, mas você não leu Butler? Como assim?”. Toda a escrita de mulheres se resumiu a uma autora-chave.

E é isso, sabe? A teoria queer foi construída dentro desse espaço acadêmico, com base nos dizeres desses três autores, no famoso modo pós-moderno, ou pós-estruturalista, ou qualquer-coisa-que-seja-obscurantista-e-excludente. Não entendo que revolução feminista é esta. É acadêmica? Poxa, que ótimo, salvar apenas aqueles privilegiados pelo sistema e que conseguem entrar em uma universidade. Aliás, vão salvar homens brancos classe média, em sua maioria. Poxa, que ótimo mesmo, que uma luta de mulheres tenha se resumindo a isso: a academicismo.

É triste, é frustrante demais. O pior de tudo é quando eu me questiono sobre os vários rumos que o movimento feminista tem tomado e tenho que engolir quieta, porque afinal, eu só sou uma menina de escola pública que conseguiu bolsa em uma universidade. Não possuo o supremo conhecimento de pós-doutorado de vocês. Mas eu só sinto muito mesmo que nosso movimento tenha se tornado isso. Eu sinto muito por todas as mulheres que lutaram por nós e que tentaram escrever sobre nossa história tenham sido apagadas.

Existem muitas meninas traduzindo materiais feministas o tempo inteiro. Existem grupos de todos os tipos que vocês possam imaginar: de livros, de documentários, de sexualidade, de apoio, de psicoterapia. O esforço é grande, mas parece que o backlash é maior.

por Débora Ramos

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