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ativismo bissexual e bifobia

eu não acredito que exista uma opressão estrutural contra pessoas bissexuais. isso não quer dizer que eu não acho que bissexuais tenham especificidades, que não sofram absolutamente nada, porque opressões não se tratam de sentimentos, e sim de realidade material, de não ter acesso a determinados espaços, de ter direitos negados.

quando se fala em bifobia, é dito que homens e mulheres bissexuais sofrem exatamente as mesmas coisas, são oprimidos de maneira igual, e eu não posso concordar com isso. mulheres bissexuais sofrem com a fetichização de suas relações quando se relacionam com outras mulheres, assim como lésbicas, são “convidadas” a participar de menage, são vistas como as que ficam com qualquer pessoa, são tratadas como indecisas e sua sexualidade está constantemente em cheque. homens bissexuais não compartilham das mesmas pautas que mulheres bissexuais. homens bissexuais não sofrem misoginia. se considerarmos que a heterossexualidade é compulsória, homens, ainda que bissexuais, se beneficiam desse sistema de exploração, se encontram no nível acima da hierarquia homens~mulheres. a heterossexualidade serve somente a homens, confere poder a homens, e as mulheres que podem vir a se relacionar com eles, colhem algumas migalhas sociais, mas continuam sujeitas a estupro dentro de casa, a sofrer manipulação emocional, a sofrer agressões físicas e psicológicas do companheiro, a ter sua integridade constantemente em risco. o que para homens bissexuais pode ser um fator limitador, para mulheres é violência, tanto com um homem quanto com uma mulher (nesse caso, por parte da sociedade).

dito isso, sobre o que é difundido como especificidades bissexuais, que citei acima, não deveria ser tratado como bifobia, porque mulheres lésbicas também passam por essas pressões sociais, então como caracterizar isso como especificidade bissexual quando um outro grupo de mulheres compartilha dessa mesma vivência? a sociedade agride mulheres quando se relacionam com outras mulheres, porque o esperado é que mulheres se relacionem com homens somente. mulheres que se relacionam com outras mulheres sofrem lesbofobia e não bifobia.
uma mulher lésbica não tem poder para oprimir uma mulher bissexual, quem dirá um homem bissexual. não existe hierarquia da sexualidade entre mulheres porque nenhuma mulher tira proveito e se beneficia da sexualidade da outra socialmente/coletivamente. dizer que uma lésbica que prefere não se relacionar com uma mulher bissexual por autocuidado é bifobia, é lesbofóbico. lésbicas não oprimem bissexuais. lésbicas podem magoar bissexuais, podem ferir sentimentos de mulheres bi, podem ter um relacionamento abusivo com mulheres bissexuais, mas isso não faz dessas lésbicas bifóbicas. é preciso fazer autocrítica quando mulheres lésbicas acusam mulheres bissexuais de falta de cuidado, de colocá-las em segundo plano por causa de homens, de fazer com que elas tenham que lidar com possíveis relações heterossexuais que bissexuais venham ter. novamente, a heterossexualidade é compulsória, ela está em todo lugar, a todo momento nos empurram para ela, e resistir a essa pressão é custoso. é “natural” tender a priorizar relacionamentos heterossexuais porque mulheres são criadas pra isso, e pode ser que nem se consiga perceber esse tipo de situação, já que é naturalizado.
mulheres não possuem privilégio heterossexual, mas existe um abismo de diferença entre vivências de mulheres hetero, mulheres bissexuais e mulheres lésbicas.

bissexuais possuem especificidades, e por isso devem ter um espaço para tratá-las, mas a autocritica se faz necessária ao ativismo bissexual, que precisa ouvir o que outras mulheres tem a dizer  e tentar construir de acordo com a realidade material, coletivamente, e parar de basear ativismo apenas em sentimentos e individualidades.

Gabi Borghi

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